segunda-feira, 22 de outubro de 2012

DIA HISTÓRICO: Dirceu, Genoino, Delúbio e Valério formaram uma quadrilha

 

"Em 44 anos de Justiça, nunca presenciei casos em que o juízo de formação de quadrilha se encontrasse tão nitidamente caracterizado como no procesos ora em julgamento"

 

VEJA

22/10/2012 - 20:13

 

Por 6 a 4, o STF confirmou a segunda condenação ao ex-ministro e consideruo 11 réus culpados do crime de formação de quadrilha

Laryssa Borges e Gabriel Castro

Depois de atestar que o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu, atuou como o senhor do mensalão, agindo como chefe dos que corrompiam parlamentares no Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal (STF) impôs nesta segunda-feira nova condenação ao ex-todo poderoso integrante do governo Lula. Desta vez, com duros votos contra a postura dos criminosos réus no processo, seis dos dez ministros da mais alta corte do país selaram o destino de Dirceu e o condenaram também por formação de quadrilha.

Na avaliação da maior parte dos magistrados, o ex-chefe da Casa Civil, os petistas Delúbio Soares e José Genoino, além do empresário Marcos Valério e dos executivos do Banco Rural Kátia Rabello, José Roberto Salgado e Vinícius Samarane, decidiram se associar especificamente para a prática de crimes. No rol de ilícitos do mensalão estão peculato, corrupção, evasão de divisas e gestão fraudulenta.

Celso de Mello, o decano da corte, apresentou o voto mais mais marcante do dia: "Em 44 anos de Justiça, nunca presenciei casos em que o juízo de formação de quadrilha se encontrasse tão nitidamente caracterizado como no procesos ora em julgamento". O ministro definiu assim os réus: "Homens que desconhecem a República, pessoas que ultrajaram suas instituições e que, atraídos por perversa vocação para o controle criminoso do poder, vilipendiaram os signos do estado e desonraram com gestos ilícitos e ações marginais a ideia mesma que anima o espirito republicano pulsante em nossa Constituição".

O decano fez uma distinção entre políticos e bandidos: "Estamos a condenar não atores políticos, mas protagonistas de sórdidas tramas criminosas. Condenam-se aqui e agora não atores ou agentes políticos, mas sim autores de crimes, de práticas delituosas". Ele falou em "conspiração" dos criminosos, "em perversa vocação"; disse que "todos nós" fomos vítimas e chegou à conclusão incontornável: "A essa sociedade de delinquentes, o direito penal brasileiro dá um nome: o de quadrilha ou bando".

A costura para a condenação dos quadrilheiros do mensalão foi possível com a proposta do ministro relator, Joaquim Barbosa, para que o julgamento fosse fatiado. A análise separada dos capítulos da denúncia do Ministério Público permitiu que o plenário do STF atestasse a existência de diversos crimes no esquema do mensalão e depois, tal qual um quebra-cabeças, concluísse que determinado grupo de aliou para o cometimento desses ilícitos. Agora, resta aos ministros definir as penas aos condenados.

Divergência –  Embora seis ministros do STF – Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Carlos Ayres Britto – tenham considerado culpados Dirceu e outros dez réus, parte do plenário endossou uma outra corrente de interpretação do crime de formação de quadrilha. Os ministros Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Cármen Lúcia e José Antonio Dias Toffoli sustentaram a argumentação de que, para existir uma quadrilha, era necessário que os criminosos atuassem para a prática de crimes “por um tempo indeterminado” e que representassem ameaça real à paz pública. Chegaram a citar o temor que uma quadrilha clássica, como o bando do cangaceiro Lampião, trazia às regiões por que passava e defenderam que nem Dirceu nem os petistas e tampouco os executivos do Rural tinham formado uma espécie de sociedade delitiva.

Os argumentos foram em vão. O ministro Joaquim repudiou a hipótese de a formação de quadrilha só ser aceita em caso de crimes de sangue, disse que os quadrilheiros do mensalão só não praticaram ilícitos por tempo indeterminado porque foram descobertos e resumiu que a corrupção de parlamentares, eleitos por voto popular, representam, sim, um grave risco à paz pública.

“Por um período considerável de tempo, quase dois anos e meio, durou essa prática nefasta de compra de parlamentares, um crime sobre o qual não há de se cogitar que seja cometido sem que haja entendimento entre pessoas, porque dinheiro não nasce em árvores. Comprar parlamentares para constitui a base de governo à base de dinheiro, isso não abala a paz social? É só o indivíduo que mora no morro e sai atirando loucamente pela cidade? Ou será que a tomada das nossas instituições políticas de maneira pecuniária não abala a paz social?”, argumentou Barbosa.

O ministro Luiz Fux, que também proferiu voto pela condenação dos réus, refutou a possibilidade de os mensaleiros terem atuado apenas em coautoria, sem a existência de uma quadrilha própria. “O elo associativo destinado à pratica dos crimes variados perdurou por mais de dois anos, o que afasta de maneira irretorquível a eventual tese de mera coautoria. O conluio não era transitório. Não se está diante de um singelo agrupamento de pessoas”, disse ele. 

Marco Aurélio Mello releu o discurso que proferiu ao tomar posse no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2006, quando proferiu uma áspera crítica aos comandantes do mensalão. Nesta segunda-feira, ele manteve o tom, citou o ex-presidente Lula e provocou o PT: “Houve a formação de uma quadrilha das mais complexas. Mostraram-se os integrantes em número de 13. É sintomático, o número”, declarou.

Ameaça - O ministro Gilmar Mendes lembrou a gravidade do esquema do mensalão: “Não se pode cogitar normal uma ordem política e social quando se tem um partido político corrompendo parlamentares. A gravidade dos fatos atenta contra a paz pública na sua concepção político-social”, disse Gilmar Mendes. Parte dos magistrados do STF interpretou a legislação para exigir que o bando tivesse o interesse de cometer crimes por tempo indeterminado e para demolir a paz pública. As quadrilhas, para esses ministros, representariam à sociedade “um perigo por si mesma”.  “Foi um atentado à democracia”, resumiu.

“É indiscutível que os núcleos (que atuaram no mensalão) jamais imaginaram formar uma associação para delinquir. Havia o objetivo de cooptação de apoio político do governo e todos os demais fatos típicos sempre tiveram por finalidade garantir o cumprimento desse desiderato”, disse a ministra Rosa Weber.

Para a ministra Cármen Lúcia, a acusação falhou ao não demonstrar que a cúpula dos mensaleiros se articulou para cometer ilícitos indeterminadamente. “Não me parece que tenha havido a comprovação do Ministério Público de que houve uma associação com fins a durar, com específica finalidade de pratica de crimes”, afirmou.

Dias Toffoli, talvez por constrangimento, não apresentou um argumento sequer para absolver Dirceu e seus comparsas: absolveu os 13 acusados em menos de 30 segundos.

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